O engenheiro agrônomo argentino e presidente do grupo Los Grobo, do setor agropecuário, Gustavo Grobocopatel, publicou artigo no jornal La Nación chamando a atenção para o avançado processo de desmatamento ilegal na Amazônia e alertando para que o mesmo não ocorra nas florestas de Chaquenho e Yungas, na Argentina, cujo ecossistema também é alvo de abandono e pouco interesse político. A análise de Grobocopatel, que também é membro do Conselho Consultivo Internacional da Fundação Dom Cabral (FDC), foi feita após intercâmbio com acadêmicos e lideranças sociais e locais, em viagem à Amazônia organizada pela FDC em setembro deste ano para a reunião anual do Conselho.
“Os exemplos na Amazônia nos permitem refletir sobre os desafios do nosso país, as regiões da floresta de Chaquenho, os Yungas, as zonas úmidas e outros ecossistemas onde a falta de visão, estratégia e qualidade operacional produzem danos desnecessários. É hora de eliminar a pobreza e a fome em nossa pátria, com um desenvolvimento que respeite as leis da natureza, inclua e coloque o homem no centro”, afirmou o conselheiro em seu artigo.
“Impacto da região é global”
O empresário traça um panorama bastante abrangente da situação da Amazônia e argumenta que o impacto da região é global, ultrapassa sua geografia e abre um debate sobre os desafios enfrentados pela Argentina. O artigo aponta que a Amazônia “é uma região de selva na Bacia do Rio Amazonas, a maior do planeta, que ocupa oito países e oito estados no Brasil” e que “vem sendo maltratada ao longo dos anos, com 19% de seu território desmatados ilegalmente: 85% para o gado e o restante para construir cidades nas poucas estradas existentes”.
Gustavo Grobocopatel cita que 60% da Amazônia estão no Brasil e a região cobre 50% do território do país. Na região, chovem cerca de 2.000 milímetros por ano, o que corresponde a absorver 25% do CO2 do planeta. Além disso, tem uma riqueza única de biodiversidade: 1/3 das espécies arbóreas do mundo, a maioria das espécies animais e 20% da água doce superficial do planeta. Abrange uma área de 800 milhões de hectares e o Estado é o grande proprietário da terra.
Amazônia continua vítima do desmatamento ilegal
O conselheiro destaca que “o desmatamento continua a acontecer anarquicamente”. Desde 2003, cerca de 2,7 milhões de hectares por ano foram desmatados, o que foi reduzido para cerca de 400 mil hectares em 2012. Com Jair Bolsonaro, o desmatamento cresceu para 1,4 milhão de hectares por ano. Agora, no terceiro mandato de Lula, caiu 48% nos primeiros oito meses de 2023, em comparação com 2022. Até 2030, Lula se comprometeu a não haver mais desmatamento ilegal.
Gustavo Grobocopatel diz que mais de 500 mil aborígenes de cerca de 300 etnias vivem na Amazônia; antes da chegada dos europeus, havia 8 milhões. O empresário afirma que a preservação da Amazônia é fundamental para a integração do Brasil e do Mercosul no mundo. “O impacto da Amazônia é global e excede sua geografia. É parte da solução para o aquecimento global e afeta a dinâmica da chuva”, diz.
A importância dos ‘rios voadores’ na Bacia Amazônica
O engenheiro lembra no artigo que alguns especialistas falam sobre ‘rios de vapor de água’ ou ‘rios voadores’ e seu impacto sobre as chuvas no Sul no Brasil e na Argentina. Segundo reportagem publicada no Valor Econômico, um estudo realizado pelo Instituto Tecnológico Vale (ITV), que analisou dados do balanço hídrico da região Amazônica entre 1973 e 2016, indica que, conforme o desmatamento avançava, reduzia-se a evapotranspiração, ou seja, a transferência de água para a atmosfera por meio da vegetação nativa, prejudicando assim a formação dos ‘rios voadores’, massas de ar carregadas de vapor que levam umidade da bacia Amazônica para o Sul do Brasil.
Para Grobocopatel, “o debate na Amazônia é cheio de desconhecimento, preconceitos e interesses”.
“O ambientalismo é conservador, procura parar a evolução e tem poucas propostas para redirecioná-la para sistemas de desenvolvimento sustentável. Um novo ambientalismo é necessário para proteger os recursos e criar uma comunidade que conheça e respeite as leis da natureza, produz bens e serviços em harmonia com ela”, defende o empresário.
Pagamento de serviços ambientais aos indígenas
O engenheiro também critica os mercados de carbono que têm implicado, segundo ele, “medidas de resiliência e não necessariamente de desenvolvimento sustentável”. Para Grobocopatel, as medidas parecem mais “uma resposta oportunista do capitalismo para não abordar as questões importantes em profundidade”. Mas, bem estruturados, os mercados de carbono podem contribuir para a economia verde da região, incluindo o pagamento de serviços ambientais aos povos indígenas.
O conselheiro cita diversas atividades que podem impulsionar a economia amazônica, sem ferir o meio ambiente, como o processamento de frutas tropicais, óleos essenciais e medicamentos à base de plantas, turismo ecológico, peixes ornamentais, exploração sustentável de madeira e outros. “Na Amazônia, os sistemas são rapidamente restabelecidos, mas deve ficar claro: o desmatamento ilegal e a exploração madeireira devem ser interrompidos e punidos como crime”, defende.
ONGs de desenvolvimento sustentável avançam na Amazônia
O conselheiro destaca a atividade de diversas ONGs e empresas na busca de soluções para o desenvolvimento sustentável. Ele cita a Fundação Amazônia Sustentável (FAS), que, com o impulso de seu líder, Virgilio Viana, já desenvolveu nove centros em várias comunidades da Amazônia.
“Lá eu pude ver como eles desenvolvem ecossistemas produtivos sustentáveis, incluindo inclusão financeira, acesso a educação de alta qualidade, saúde preventiva, empoderamento, empreendedorismo, gestão e transparência, inovação, criação de infraestrutura comunitária e integração através do turismo e outras atividades. Estes desenvolvimentos públicos e privados nos dão esperança”, conclui Grobocopatel.