Os problemas ligados à saúde mental vêm deixando de ser um assunto tabu nas empresas, conforme mostra reportagem publicada em O Globo, em janeiro. Antes mesmo da pandemia, as companhias passaram a se preocupar mais com o bem-estar dos funcionários, seja por meio de soluções próprias ou contratando serviços externos. Hoje, os investimentos são uma forma de cuidar da saúde dos empregados e também de reter e atrair talentos. As iniciativas também fomentam o mercado de empresas especializadas em saúde mental, que viram suas bases de clientes se multiplicarem. 

Na Mondelez Brasil, o trabalho na área vem sendo feito desde 2018. A empresa transformou o clássico ambulatório em um programa de saúde integral, que inclui médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e terapeutas. 

“Implementamos assistência social e psicólogos, adicionalmente a um programa de auxílio jurídico e planejamento financeiro, porque uma das questões que levam a pessoa a ter problemas emocionais é a saúde financeira”, conta Jorge Morato, diretor de Saúde, Segurança e Meio Ambiente da Mondelez Brasil. 

Aplicativo permite terapia online

A empresa também promoveu flexibilizações no período de trabalho às segundas e sextas-feiras. Outras iniciativas foram a utilização de um aplicativo que permite ao funcionário fazer terapia on-line e a realização de uma triagem para mensurar como está a saúde mental de cada empregado. 

“Durante a pandemia, percebemos que precisávamos chegar antes e não ser só reativo. Conseguimos mapear casos na fase inicial e direcionar o apoio correto. Essas pessoas, se o mercado vier e oferecer um dinheiro a mais, vão ponderar o cuidado que tiveram quando precisaram”, avalia Morato.

Multinacional subsidia consultas com psicólogos

Desde 2019, a unidade brasileira da multinacional de tecnologia SAP realiza atividades direcionadas à saúde mental. Entre elas, estão rodas de conversas, campanhas de conscientização e parcerias com empresas especializadas, que disponibilizam consultas com psicólogos. A SAP subsidia um percentual das sessões. 

A diretora de Recursos Humanos da SAP Brasil, Fernanda Saraiva, destaca que, além dos funcionários, é importante sensibilizar os gestores, para que se crie uma cultura na qual haja liberdade para falar desses problemas. “O RH não consegue estar em todos os lugares, então, é muito importante a conscientização dos líderes de equipes. Se você não trabalhar saúde mental, vai estar com um problema para atrair e reter talentos”, argumenta Fernanda. 

A diretora da SAP Brasil conta que a empresa decidiu criar um feriado corporativo. A iniciativa começou em 2021 e é um convite para que os funcionários façam atividades que gerem satisfação neste dia. 

Ações ajudam a reter funcionários 

Trabalhando em uma multinacional há 22 anos, o gerente de Merchandising José Mário Lessa lidera um time de 500 pessoas em São Paulo e vê benefícios nessas iniciativas. Ele tem feito uso dos serviços que a empresa oferece, como flexibilizações no horário de trabalho e um aplicativo de terapia on-line. 

“Vez ou outra somos assediados pelo mercado, e um dos fatores que ajudam na decisão é olhar o quanto a companhia tem de preocupação comigo”, diz José Mário.

A movimentação das empresas também estimula o crescimento de um mercado de companhias especializadas em oferecer soluções para saúde mental. É o caso da Zenklub, criada em 2016 após a mãe do CEO, Rui Brandão, sofrer um burnout no trabalho. 

A empresa possui um aplicativo com conteúdos que incluem meditação interativa, videoaulas e consultas virtuais, além de capacitação e treinamento de lideranças. 

De 2019 para 2021, o volume de consultas on-line realizadas pela Zenklub cresceu 1.059%, chegando a 603 mil sessões. Já o número de vidas cobertas aumentou 1.664% no mesmo período, chegando a 300 mil vidas. Hoje, são 400 clientes corporativos. 

Uma experiência pessoal negativa ao lidar com problemas de saúde mental também foi o motivador para a criação da Vittude, em 2016. Segundo a CEO, Tatiana Pimenta, a empresa começou como um marketplace que conectava pessoas a psicólogos. 

Burnout pode ser considerado doença de trabalho

Quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) sinalizou, em 2018, que o burnout poderia se tornar uma doença de trabalho, Tatiana viu uma oportunidade para que a companhia crescesse. “Significava que eu estava deixando de dizer que o burnout é uma doença da pessoa e dizendo que ela é causada pelo ambiente de trabalho, o que tem previsão previdenciária e trabalhista”, disse. 

Com a pandemia, a base de clientes corporativos explodiu, passando de sete, em março de 2020, para 200, atualmente. Em número de vidas cobertas, o salto foi de 5 mil para 600 mil.