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Cenários econômico e geopolítico podem interferir na longevidade corporativa

Professores da FDC e da Nova SBE Portugal mostram como o Brasil está posicionado geopoliticamente, quais cenários e como as empresas brasileiras podem se adequar a esses cenários

longevidade corporativa Foto por: Homero Xavier/FDC
por Redação setembro 26, 2022

Em uma apresentação sobre aspectos econômicos e geopolíticos do Brasil e do Mundo, Daniel Traça, professor da Nova SBE Portugal, e Gilmar Mendes, professor da Fundação Dom Cabral, mostraram cenários distintos de otimismo e alerta para o avanço do Brasil e de suas empresas e sociedade. Do lado otimista, Mendes avalia que o Brasil tem feito as lições de casa e apresentou exemplos dessa defesa.

A primeira envolve o fenômeno inflacionário, que é global, mas para o qual o Brasil já tem demonstrado sinais de arrefecimento. “Hoje, a estimativa é que o Brasil feche 2022 com inflação de 7,1% no ano. Com isso, começamos também a arrefecer a política monetária, fazendo com que a tendência seja de que as taxas de juros também comecem a declinar”, disse.

O professor da FDC também pontuou a oportunidade energética, dado que a matriz brasileira é 85% renovável. Isso, defendeu ele, configura não só uma oportunidade industrial para as empresas que buscam ser abastecidas por energias renováveis, mas também para o desenvolvimento do hidrogênio verde, através da eletrólise da água. “O Brasil é o país de maior potencial de desenvolvimento de energias renováveis no mundo e é preciso energia limpa para a produção de hidrogênio verde. A Europa, que é quem está mais avançada em termos de descarbonização, prevê produzir 20 milhões de toneladas de hidrogênio verde em 2030, sendo que metade disso pode ser feita no Brasil, por exemplo”.

Sobre as tensões comerciais envolvendo Estados Unidos e China – e as suas consequências para a economia brasileira e de outros países emergentes – Mendes apresenta um mapa de tonalidade mostrando os países mais alinhados à China ou aos EUA economicamente. O Brasil aparece no equilíbrio exato e o professor destaca positivamente a nossa posição neutra para comercializar com ambos. “Temos outros aspectos otimistas. E lembro do Ariano Suassuna que, quando questionado o que achava do pessimista, respondeu: ‘um chato’. Já o otimista, quando demasiado, ele classificou como ‘exagerado’ e disse que o ideal mesmo é o ‘otimista ponderado’’’.

Outro ponto positivo destacado por ele é o fato de que o Brasil ficou com uma carteira de ativos diferente de outros países latino-americanos, já que demoramos para fazer algumas desestatizações. “Porém, elas estão ocorrendo agora e temos um conjunto de ativos públicos interessantes para atrair investimentos”, disse.

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Gilmar Mendes | Foto por: Homero Xavier/FDC

Gilmar lembrou ainda que, ao investir entre 18% e 20% do PIB, o Brasil historicamente alcança crescimento de 3% a 3,5% do PIB. “E hoje estamos investindo 20%, pavimentando um período de crescimento”, comparou.

Problemas a serem observados

O professor Daniel Traça, da Nova SBE Portugal, ponderou os desafios a serem enfrentados pela economia brasileira e mundial, das empresas e sociedade no geral. No contexto geopolítico, ele lembra que a China foi o grande motor da globalização nos últimos 20 anos e hoje já não é uma economia de mão de obra barata apenas, como foi há pouco tempo, mas sim um dos maiores centros de inovação do mundo. Para o futuro, resta a dúvida se ela continuará nessa toada ou se irá desacelerar e isso pode impactar profundamente a economia brasileira. “Atualmente, a China está em processo de transição de economia emergente para desenvolvida. Poucos países têm sucesso nessa transição. Por isso precisamos observá-la”, pontuou Daniel Traça, professor da Nova SBE Portugal. 

Segundo ele, a China pode ir na direção do Japão, que passou de uma grande promessa para a estagnação após os anos 1980. Cerca de 30% do PIB da China é baseado em real state, que está inflacionado, com muitas empresas falidas e com grande aporte da classe média nesses empreendimentos. “Andando pela China, o que recomendo, é possível ver a absurda quantidade de imóveis vazios. Isso cria o risco de uma bolha imobiliária, com tudo que acarreta para o sistema bancário/financeiro”, disse. “Além disso, há as faltas de resultados ocasionados  pela Covid-19”, completou.

Daniel Traça não acredita em um conflito armado entre China e EUA no futuro próximo, mas prevê sim uma “guerra morna”, o que, para países como Brasil, Turquia, Irã, entre outros em desenvolvimento, se configura mais um desafio: o de se equilibrar entre as duas potências, sem tomar um lado.

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Daniel Tarça| Foto por: Homero Xavier/FDC

Quanto às questões ESG (ambiental, social e governança) o professor português tem uma posição crítica. “Não sou nada otimista com o ESG. Primeiro porque o greenwashing está aí e depois porque os critérios de avaliação de ESG para as empresas são falíveis e não estandardizados”, disse. Usando também o exemplo da União Europeia, ele defende que é a região onde a descarbonização mais avança e isso se deve ao ambiente regulatório lá criado. “É preciso padronizar os critérios ESG e não se pode esperar que esse avanço ocorra apenas pelas pressões do setor financeiro”, disse.

Pontuando desafios para o avanço das empresas brasileiras, ele diz que precisamos desenvolver talentos, pois “não há histórico no mundo de país que avançou sem desenvolver a educação e tampouco há exemplos de países que avançaram na educação e não se desenvolveram”, disse.

Em um cenário de futuro, Daniel Traça pondera que não há certezas e que “muitas das coisas que veremos nos próximos anos nem sequer estão no radar ainda”. Porém, avaliando que o aumento da desigualdade social ocorre desde o avanço da globalização nos anos 1980 e foi ainda mais acentuada pelo avanço tecnológico das últimas décadas, ele compara que esse movimento emerge lideranças populistas, que depois desencadeiam a descrença da população pela política.

Como contexto para essa última afirmação, o professor português destaca que 0,1% da população dos Estados Unidos concentra 11% da riqueza do país, enquanto no Brasil, os 10% mais ricos detêm 50% do capital. “Na economia americana, 51% das horas trabalhadas serão automatizadas até 2050. Portanto, esse cenário tende a ser ainda mais desigual se nada for feito. E o problema é que não há solução prática para isso, o que favorece os discursos populistas que depois desencadeiam na polarização que estamos assistindo mundialmente, com expoente na Itália [que, ao que tudo indica, acaba de eleger Giorgia Meloni, candidata populista de extrema direita que estava liderando as intenções de votos]”, disse.

O papel da liderança corporativa 

A descrença política faz com que 55% das pessoas acreditem que as empresas têm mais capacidade de resolver problemas da sociedade que os governos. “Olhando especificamente para o Brasil, ocupamos a décima, de 16 posições entre os países com menos confiança da população em seus governos”, acrescentou Daniel Traça.

Segundo ele, 81% das pessoas responderam que o CEO deve ter uma posição pública sobre temas da sociedade como economia, desigualdade de salário, guerras e urgência climática, mostrando que “as pessoas de hoje só confiam em quem elas conhecem e é por isso que acreditam que os líderes resolverão não apenas os problemas relacionados ao trabalho, mas também poderão agir em problemas da sociedade”, concluiu.




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