Certamente, essa não é uma questão com uma única resposta. Existem diversas justificativas, pontos de vista e contextos importantes. Mas convém reconhecer e ressaltar, logo de saída, que trata-se de um tema fundamental, urgente e incontornável para os líderes de negócios. Neste sentido, proponho alguns elementos importantes para contextualizar a discussão.

Comecemos pela consciência emergente de que as empresas prosperam (em múltiplas dimensões) quando oferecem à sociedade soluções inovadoras que vão além do escopo estrito do foco dos negócios. Em outras palavras, quando elas retornam para a sociedade, mais do que extraem, não apenas de forma diretamente ligada aos produtos, mas também no que diz respeito a aspectos culturais e sociais, por exemplo. Aliás, é o que se espera delas, é função delas em uma perspectiva ampliada do que chamamos de contrato social.

Esta ampliação das expectativas sobre os negócios tem sido consistentemente detectada nos estudos globais sobre confiança, alçando as empresas ao patamar de instituição mais confiável, competente e ética para propor soluções em benefício da sociedade. Diante dessa manifestação profundamente significativa, honrar tal credibilidade em um momento histórico de profunda crise de confiança e significado emerge como atributo diferenciador, se não qualificador mesmo, para as empresas. Afinal, a confiança segue sendo um pressuposto básico da licença social para operar de todas as empresas. 

Outra razão pela qual as empresas devem investir em mulheres é o simples fato de que uma das perspectivas mais básicas da gestão dos negócios é a gestão de seus impactos e riscos. Esta perspectiva traz o corolário necessário de que não podemos gerir um risco do qual não temos consciência e com o qual não entramos em contato. É isto que acontece com as violações dos direitos das mulheres. Longe de ser um ‘problema das mulheres’, os efeitos perversos dessas violações perpassam as famílias, as empresas, as comunidades e os negócios, além, é claro, das próprias mulheres. Um estudo recente do FMI com base em dados da África Subsaariana examina os efeitos multidimensionais sobre a saúde da economia, tanto a curto quanto a longo prazo, decorrentes da violência contra mulheres e meninas. Os dados apresentam uma correlação de declínio de 9% na atividade econômica associada ao aumento de 1% nos índices na violência contra as mulheres. Este é apenas um dos estudos que demonstram a clara correlação entre o aumento das violações dos direitos humanos das mulheres e o fardo econômico por ele desencadeado. 

Consideremos, portanto, algumas formas de responder à nossa questão inicial a partir das ponderações já relatadas.

Bom, é fundamental compreender que o acesso das mulheres aos direitos humanos – direito à vida, à saúde, à integridade física, à liberdade de expressão, etc – ainda são frequentemente violados, especialmente no Brasil, que ocupa o vergonhoso lugar de quinto país que mais mata suas mulheres por menosprezo à condição da mulher. Isto, em si, por uma questão ética, já seria razão suficiente para investirmos na construção de uma sociedade mais equilibrada, mais justa e equitativa. Pois assim como não existe empresa próspera em uma sociedade miserável, não há um país economicamente avançado construído a partir de uma sociedade adoecida.

Considerando também que a desigualdade entre os gêneros representa uma ameaça ao desenvolvimento econômico, quais os riscos e os custos incorridos pela empresa como consequência deste risco social? Ora, observando evidências de que mulheres em lares abusivos tendem a ter maiores taxas de absenteísmo, perdas de produtividade, de capacidade de concentração e decisão,  bem como, a longo prazo, dificuldades na aquisição de qualificações, ciclos mais curtos de empregabilidade e lacunas mais longas de desemprego, fica claro que as empresas, quer se deem conta disto ou não, incorrem em altos custos diretos (perda de produtividade), ou indiretos (financiamento de serviços públicos de saúde, assistência social e justiça) em decorrência da violação de direitos das mulheres.

Além disso, as mulheres costumam investir parte significativa de sua renda na educação dos filhos, na saúde e alimentação da família, bem como no bem-estar da comunidade. Por isso mesmo seu papel indutor de desenvolvimento econômico já é bastante reconhecido e demonstrado por meio de programas de distribuição de renda, empreendedorismo e inovação social.

De fato, as evidências apontam para a centralidade do interesse das empresas em usar os seus ativos para promover relações sociais menos desiguais. Integrar noções básicas de dignidade, equidade e respeito àquelas que representam mais de 50% do pool de talentos, bem como a principal voz de definição nas decisões de compra em mais de 70% dos lares brasileiros, é de interesse dos negócios além de ser uma questão de justiça que demanda atenção imediata, engajamento coletivo e investimentos do setor privado como ator de primeira grandeza no espaço cívico.

* Daniela Marques Grelin é Diretora-Executiva do Instituto Avon.