A proposta da emenda constitucional (PEC) 10/2023 que traz de volta o pagamento de um adicional por tempo de serviço (ATS) para membros do judiciário está no centro de uma discussão entre especialistas. Chamada de PEC do Quinquênio, ela institui um “bônus” de 5% do salário a cada cinco anos de atividade na remuneração dos beneficiados. A legislação tramita no Senado e pode representar um acréscimo de até 42 bilhões por ano no orçamento público federal.
Esse valor é considerado o máximo que a medida impactaria nos cofres, segundo a própria agência de notícias do Senado. De acordo com o informativo, os cálculos consideram dois cenários.
No primeiro deles, o pagamento do quinquênio seria limitado aos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público (MP), como previa o texto original da PEC 10/2023. Neste caso, o acréscimo sobre despesas remuneratórias seria de R$ 5,2 bilhões por ano: R$ 3,1 bilhões para magistrados e R$ 2,1 bilhões para membros do MP. O cálculo leva em conta pagamentos a servidores ativos e aposentados e a pensionistas.
Já o segundo cenário considera outras 13 carreiras incluídas na PEC 10/2023 por meio de emendas. Essa extensão foi proposta no relatório do senador Eduardo Gomes (PL-TO) e eleva a conta total para R$ 42 bilhões.
A lista adicional de beneficiados incluiria defensores públicos, auditores fiscais do Trabalho, auditores fiscais e técnicos da Receita Federal, fiscais de tributos, policiais civis, federais, rodoviários federais e legislativos, advogados da União, militares estaduais, oficiais de Justiça e membros de Tribunais de Contas.
Análises sobre a PEC dos Quinquênios
Para o analista Alessandro Casalecchi, ouvido na reportagem do Senado, o impacto está sendo subestimado e pode ser muito maior. Ele levanta duas possibilidades técnicas para isso. A primeira é o fato de que, segundo a emenda, os servidores teriam direito ao benefício por atividades jurídicas realizadas antes mesmo do ingresso no serviço público.
E mais: haveria um segundo impacto adicional sobre aposentados e pensionistas. Na avaliação de Casalecchi, o resultado para os aposentados e pensionistas é superior ao impacto associado aos ativos. Ele estima que o adicional médio dos aposentados e pensionistas é 2,3 vezes superior ao adicional médio dos ativos.
Para Samuel Hanan, ex-vice-governador do Amazonas e engenheiro especializado em macroeconomia, a PEC dos Quinquênios é grave equívoco, ao perpetuar discrepâncias salariais significativas entre os poderes e carreiras dentro do serviço público.
Em artigo para o site Consultor Jurídico, Hanan destaca o teto limitador para a remuneração dos beneficiados, que seria de 35% do teto constitucional, que tem como parâmetro os subsídios dos ministros do STF. Para ele, o limitador tenta apenas dar “ares de moralidade” a uma proposta que reforça os abismos sociais no país.
Contra a medida, o especialista informa que o valor estimado de R$ 42 bilhões como gasto adicional da PEC dobraria a qualidade da educação para mais de 2 milhões de estudantes, ou da saúde para mais de 8 milhões de brasileiros. Esses números estão baseados no custo anual de R$ 18 mil com cada estudante e R$ 5 mil com a saúde de cada pessoa.
Outro problema é a assimetria causada pelo benefício: cerca de 32 mil funcionários de um total de mais de 10 milhões existentes no Brasil seriam contemplados. Ou seja, a medida também amplia a desigualdade remuneratória entre servidores e só melhora os ganhos de quem já recebe proporcionalmente mais.
Patrícia Becker, diretora de Gestão Pública da Fundação Dom Cabral (FDC), também vê na PEC 10/2023 o reestabelecimento de uma medida que “amplia as distorções no serviço civil”. Para a especialista, a proposta não é a melhor forma de promover capacidades e valorizar os agentes públicos.
No entanto, Patrícia reforça o papel de um serviço civil organizado, qualificado e bem valorizado. “Defendemos a necessidade de reorganização das carreiras, cargos e remunerações em linha com a complexidade relativa das ocupações e com os parâmetros remuneratórios do mercado de trabalho no Brasil”, argumenta.
De acordo com a diretora da FDC, é fundamental estudar possibilidades e debater alternativas que sejam, de fato, edificantes para o serviço público.