Desde a antiguidade, a palavra “valor” vem ganhando múltiplos significados e é importante entendê-la no atual mundo dos negócios. Esse é o tema aprofundado em artigo pelos professores da Fundação Dom Cabral, Fabian Salum e Karina Coleta. O texto é fruto de quase dez anos de pesquisas sobre o tema e se destina ao mundo acadêmico voltado aos negócios.

O artigo começa abordando a expressão “criar valor”, em voga nos discursos empresariais. “Cada vez mais pretendido pelas instituições e pelos CEOs, o ato de criar valor tem um papel central tanto na análise de um projeto de negócio quanto nas escolhas sociais”. Entretanto, continua o artigo, o núcleo dessa expressão é a palavra “valor”, cuja interpretação nem sempre pode ser dada como garantida e alinhada entre os atores do debate. 

O texto continua afirmando que “diante da pergunta: ‘valor para quem?’, as respostas certamente irão variar conforme a perspectiva. A clareza quanto ao que é valor facilita a compreensão das ações dela derivadas, e que fazem parte do vocabulário de negócios: ofertar, propor, criar, capturar e até destruir valor. Quando se fala em estratégia e modelos de negócios, a questão do valor é o fundamento dessas ações”.

Mas afinal, o que é valor?
A pergunta sobre valor é antiga. Na língua grega, valor é ‘axía’ – que dá origem à axiologia, estudo dos valores – sua definição é a apreciação de algo realizado. O valor, portanto, está ligado ao reconhecimento e mérito das coisas e ações. “Também pode se referir ao domínio econômico para indicar preço”, pontuaram os autores.

Séculos depois, a visão de Max Weber (1864-1920) avança no sentido de se pensar o valor em seu âmbito social e nas interações sociais. “O primeiro ponto defendido pelos autores é a definição clara de valor ao se pensar o estudo sociológico, seja um valor objetivo ou subjetivo (eliminável). Contudo, é importante ressaltar que, para Weber, o valor é parte do processo de tomada de decisão”, defenderam.

Outro ponto destacado sobre Weber traz para o debate sociológico, que é o papel da moral e dos valores na orientação das condutas individuais. “As relações coletivas impactam diretamente as condutas individuais, atribuindo um sentido e valor, direcionando a ação social. Ou seja, os valores e ações são construídos socialmente através dessas interações e relações sociais”.

Multilateralismo do valor

A realização do valor, mostrou o artigo, não é unilateral e está aberta a múltiplos agentes, como direcionamento (fonte e alvo), julgamento (atribuição de valor) e mensuração apropriação do valor. 

“Ao falarmos de criação de valor, é preciso articular o alvo do valor e aquele que o produz e pretende captar algum benefício dessa produção. Assim, em vez de abordar o tema de forma genérica, é necessário indicar a fonte e para quem o valor é criado. A fonte entra com o potencial de valor e o alvo com sua capacidade de perceber o valor. Consequentemente, as partes envolvidas assumem dois tipos de julgamento. O primeiro é o de quem apresenta o valor. Isto é, o ofertante julga que aquilo que propõe seja valor para a outra parte. O segundo é o julgamento daquele que percebe a oferta de fato como valor.”

Ambos os julgamentos se materializam em ações, segundo os articulistas. Por parte da empresa, tem o ato de propor/ofertar valor e esse movimento começa com um valor potencial que representa a hipótese da empresa sobre o que o consumidor valoriza. 

Já o julgamento do consumidor é materializado pelo engajamento na troca, propriamente dita. Isso reforça que é o encontro que permite a relação entre ambos no sentido de atribuição de valor. “Assim, o valor não reside no alvo nem apenas na fonte, mas sim no encontro deles”, avaliaram os autores.

Criação de valor é um sistema dinâmico

As relações dialéticas (entre organização e sociedade) são as tônicas para a compreensão da construção de valor na atualidade, segundo eles. Assim, a criação de valor é um sistema dinâmico, e não estático, e sustenta o crescimento ao longo do tempo, promovendo o giro em ciclos virtuosos.

O movimento, explica o artigo, tem início no quadrante Agregar Valor, que representa a produção de produtos, serviços e soluções que a empresa oferta de acordo com o que o consumidor valoriza e/ou necessita. A troca, a percepção e as expectativas por parte do consumidor acontecem no quadrante de Criar Valor, também conhecido como Gerar Valor, que sustenta o crescimento do ciclo ao longo do tempo. Nesse momento, ocorre o engajamento e a interação entre as partes, fonte e alvo. 

Já na Captura de Valor ocorre a monetização, realizada pela troca de bens e serviços da fonte ou empresa que disponibiliza a oferta de valor. Por último, o Valor Distribuído, envolve o reconhecimento dos benefícios tangíveis e intangíveis dos produtos e/ou serviços. 

Esses quatro aspectos criam o que os autores chamaram de ciclo virtuoso e recursivo, e que deve se manter dinâmico e constante, a fim de produzir novas ofertas de valor. “Mas para onde caminha a nova face de valor nas organizações? Mediante a contextualização apresentada sobre o conceito de valor, podemos afirmar que o valor não reside no alvo, nem apenas na fonte, mas sim no encontro ou na interação do julgamento. Da colaboração e diálogo de ambos os lados – empresa e consumidor”, defenderam

Ciclos virtuosos

Os professores entendem que, por parte da empresa, há o ato de propor valor por meio da oferta relevante e valorizada pelo consumidor. Para o consumidor, o julgamento é materializado pelo engajamento da troca. Ou seja, é o encontro que permite a relação entre ambos, no sentido de atribuição de valor e observação do valor realizado. 

A partir desse momento, o valor capturado se concretiza por meio da aquisição (monetização), enquanto o valor distribuído vem pelo reconhecimento da dinâmica que gera o benefício e retroalimenta a lógica do ciclo. “Dessa maneira, os ciclos virtuosos podem ser tangibilizados para contemplar as novas faces de valor para as organizações”, finalizou o artigo.