A sucessão familiar é um momento crítico e, frequentemente, traumático para muitas organizações. Muitas vezes, a transição entre gerações não ocorre de forma planejada e estratégica, o que coloca em risco a continuidade do negócio.

Diante de um cenário cada vez mais complexo e competitivo, entender os novos paradigmas da sucessão é essencial para garantir a perpetuidade das organizações familiares.

A empresa familiar, embora frequentemente subestimada no universo corporativo, desempenha um papel fundamental na economia brasileira. Segundo o IBGE, ela compõe mais de 90% dos negócios no país e contribuem significativamente para o PIB, sendo responsáveis por quase 75% da força de trabalho nacional.

Alguns dados da pesquisa Global Family Business Survey, da PwC, revelam que mais de 70% das empresas não sobrevivem à transição para a segunda geração, e apenas 15% chegam à terceira. Esses números evidenciam a necessidade de um planejamento sucessório sólido e antecipado.

Contudo, a transição de comando nessas organizações apresenta desafios únicos, que exigem planejamento, estratégia e um equilíbrio delicado entre laços familiares e objetivos empresariais.

Desafio da sucessão familiar na atualidade

Para começar, é importante destacar que a dinâmica dos negócios familiares mudou significativamente. Antigamente, a sucessão era quase automática: o fundador passava o comando para o filho mais velho, independentemente de suas aptidões. Hoje, a profissionalização e o preparo se tornaram aspectos centrais.

A escolha do sucessor não pode mais ser baseada apenas em laços sanguíneos, mas sim na competência e na capacidade de liderar o negócio rumo ao futuro.

Além disso, a nova geração que assume o controle traz consigo valores e expectativas diferentes. Eles cresceram em um ambiente digital, com uma visão mais global e menos apegada às tradições rígidas. Assim, o desafio é encontrar um equilíbrio entre respeitar o legado da empresa e implementar inovações que assegurem a competitividade.

Estratégias para uma sucessão familiar bem-sucedida

Uma sucessão familiar bem-sucedida, portanto, exige planejamento, diálogo e uma visão estratégica clara. A seguir, exploramos alguns dos novos paradigmas que podem ser adotados para facilitar essa transição.

Planejamento antecipado e transparente

Antes de tudo, o planejamento antecipado é o alicerce de uma sucessão tranquila. Muitos empresários evitam esse tema, por ser delicado e envolver questões emocionais. No entanto, deixar a decisão para o último momento pode gerar conflitos internos e até prejudicar a saúde financeira da empresa.

O ideal é que o processo de sucessão seja discutido abertamente entre todos os envolvidos, incluindo membros da família e executivos-chave. Isso reduz a incerteza e facilita o alinhamento de expectativas.

Um plano de sucessão deve considerar o perfil dos candidatos, as necessidades futuras da empresa e o tempo necessário para o desenvolvimento do sucessor.

Para garantir transparência, a criação de um conselho familiar pode ser uma excelente iniciativa. Esse conselho atua como um espaço formal para discutir questões estratégicas e facilitar a comunicação entre as partes interessadas.

Profissionalização e desenvolvimento do sucessor

sucessão familiar

Outra estratégia fundamental é a profissionalização. A próxima geração deve ser preparada não apenas com base na experiência familiar, mas também com conhecimentos técnicos e de mercado.

Investir na capacitação do sucessor é crucial para que ele tenha uma visão ampla e seja capaz de tomar decisões embasadas.

Programas de mentoria, cursos de liderança e experiências em diferentes áreas da empresa são formas eficazes de preparar o futuro líder. Além disso, é importante que o sucessor tenha vivências fora do ambiente familiar, trabalhando em outras organizações para adquirir uma perspectiva diferenciada.

A profissionalização também se estende à gestão como um todo.

Contar com uma estrutura de governança sólida, que inclua conselhos de administração independentes e auditorias externas, ajuda a empresa a manter um padrão elevado de gestão, independentemente de quem esteja no comando.

Alinhamento de valores e propósito

A sucessão não deve ser vista apenas como uma troca de liderança, mas sim como uma oportunidade de reforçar o propósito e os valores da empresa. Portanto, é essencial que o sucessor compartilhe da mesma visão de longo prazo e se comprometa com a cultura organizacional.

O diálogo entre gerações é fundamental para garantir esse alinhamento. Muitas vezes, o fundador tem uma visão mais conservadora, enquanto o sucessor quer trazer inovações. Nesses casos, o desafio é encontrar um ponto de convergência, onde a inovação respeite o legado e a tradição.

Ferramentas como workshops de cultura organizacional e dinâmicas de construção de propósito podem ajudar a fortalecer esses laços e criar um senso de continuidade entre as gerações.

Evitando os erros mais comuns

Agora, é importante também mencionar os erros que devem ser evitados no processo de sucessão. Um dos mais frequentes é a falta de preparo emocional dos envolvidos.

A transição de poder pode gerar sentimento de insegurança e ciúmes, especialmente quando o fundador não está pronto para abrir mão do controle.

Outro erro comum é não envolver profissionais externos no processo. Consultores especializados em governança familiar podem trazer uma visão imparcial e ajudar a mediar conflitos. Além disso, a presença de executivos não familiares em cargos estratégicos pode agregar valor e profissionalismo à gestão.

A importância da comunicação clara

A comunicação clara e contínua é fundamental. Muitas vezes, os conflitos familiares surgem por falta de diálogo. Nesse sentido, criar espaços formais de comunicação, como reuniões periódicas e fóruns familiares, é uma maneira eficaz de evitar mal-entendidos e garantir que todos estejam na mesma página.

Uma comunicação eficiente também inclui deixar claro quais são as expectativas em relação ao sucessor e definir metas objetivas. Isso ajuda a reduzir as incertezas e facilita o processo de transição.

A sucessão familiar, quando bem planejada, pode ser uma oportunidade de renovação e crescimento para o negócio. Além de preservar o legado, o processo deve preparar o terreno para um futuro promissor, baseado na competência, na inovação e no compromisso com a visão de longo prazo.

Com as estratégias certas e o suporte adequado, é possível transformar um momento de transição em um marco de sucesso e perpetuidade. Afinal, a continuidade de um negócio vai além dos laços familiares: é preciso ter a capacidade de liderar com propósito e visão estratégica.

Marcelo de Elias
Marcelo de Elias (Foto: Reprodução/ LinkedIn)

* Marcelo de Elias, do Centro de Inteligência em Médias Empresas da FDC